Há poesia nascendo destes seres notívagos
que procuram cristais nas pedras mais empedernidas
Há poesia nascendo nas lâmpadas que pingam dos astros
nas selvagens pupilas das meninas
Há poesia nascendo nestas vísceras abertas nas ruas
no rasgar-se e entregar-se a alguém
e continuar inteiro
Há poesia nascendo no insistir em ser mais forte que a dor
Há poesia nascendo no verde rosto dos homens
nestes amigos transparentes sóis enluarados
nestes peões ao redor da luz
no duvidar e encontrar com deuses
na cama dos amantes proibidos
nos corações devassados que ainda amam
Há poesia nascendo no ar debochado dos vassalos
na ternura dos loucos na lucidez suicida
neste azul infiltrado nos cárceres
na densidade marítima que arrasta nossas estruturas
Há poesia nascendo nas mãos espalmando jardins
entre os inimigos do rei
entre os expulsos de Pasárgada
nos filhos esquecidos de deus
na fala lânguida dos cães
na pálpebra dos girassóis que amarelo! resistem
Há poesia nascendo nos corações desarmados para a vida
na gargalhada estrepitosa dos inventores de moinhos
no arrancar de máscaras a mostrar o cristal do rosto
na teimosia em ter raízes e crescer vegetalmente
Há poesia nascendo nestas rugas que florescem para a morte
Há poesia nascendo na espantosa magia de que estamos nascendo
para Ivan Lilitch,
Manuel Bandeira
e Jorge de Lima